quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

TAMBÉM HÁ LÍRIOS NO LODO



                    

                 TAMBÉM HÁ LÍRIOS NO LODO

Ninguém é santo! Seria demasiada ingenuidade esperar que os ânimos exacerbados na disputa política cujo nível só atinge a excelência no teor das ofensas e profundidade nas medíocres propostas fossem capazes de exibir com nobreza suas lídimas intenções.
Seria pedir demais. Seria inocência sem precedentes, às raias da burrice.
Por que aceitamos estas condições que agridem o bom senso e o nosso discernimento? Será que, inconscientemente, apoiamos este comportamento promíscuo na política e, por ignorância ou comodidade, consideramos que este índice de despudorada desfaçatez é conveniente às nossas fundamentais necessidades? Ou será que o descrédito nos faz reagir de forma indulgente, distante, acomodada, alheia?
A propaganda política procura ocultar o baixo nível de qualidade dos candidatos. Expõe a manipulação que escorre pegajosa das imagens, frases, ambições. Não é preciso ter inteligência superior ou alta sensibilidade para se observar. É grosseira. Deixa claro que seu objetivo é atingir, maciçamente, um público de baixa atenção e pouca, pouquíssima exigência.
Frases e imagens são repetidas à exaustão para que se tornem “verdades” subliminares.
Interessante ver o processo de “confecção” de um candidato. Dependendo do nível de ambição, este projeto se sofistica despudoradamente e seu custo empenha a vitória.  Cirurgias plásticas diminuem queixos, acomodam narizes, ajustam orelhas, implantam cabelos, retiram rugas, refazem dentes e maxilares. O botox ganha relevância nunca antes vista na estória deste país. Cabelos são tingidos. Sapatos com saltos embutidos alteram a altura. Roupas são cuidadosamente selecionadas para que feitios e cores informem ao público com dignidade a informalidade do candidato. Aulas de postura, manejo das mãos, do andar, do sorriso são cuidadosamente planejadas. A arte dos grandes gestos é treinada. Percebi, certa vez, que um candidato quando queria demonstrar segurança debruçava-se com intimidade sobre o pedestal que sustinha o texto do discurso. A aquisição de vocabulário e as frases de impacto repetidas à insanidade e até a modulação da voz são condições que fazem deste discípulo dedicado, um vencedor.
Quero esclarecer que o sucesso das aulas de impostação de voz, não raras vezes, deixa a desejar e que a expressão corporal embora treinada à desmedida sugere pistas da medíocre criatura matriz. Perfeição seria milagre.
Lembro-me de um presidente que ao mentir em discurso revirava os olhos e os erguia para os céus como se pedisse perdão pelas blasfêmias. Era um movimento involuntário, resquício talvez de consciência.
Quanto maior a excelência no processo de construção do candidato mais fica evidente a importância de vida e de morte no jogo do poder.
Há um batalhão de especialistas, profissionais caríssimos,mestres na arquitetura e montagem deste ser quase alienígena!
Quem é esta criatura que se submete à tamanha metamorfose, cumprindo um ritual exaustivo, muitas vezes doloroso, alheio a sua verdadeira identidade? Por que, mesmo conscientes desta manipulação, acreditamos que ele ou ela será capaz de cometer a verdade.
De tempos em tempos, o jogo político é aberto. As cartas estão na mesa. É um jogo asqueroso. Quanto mais os jogadores forem capazes de trapacear, mais serão louvados pela malícia, perspicácia, inteligência, cumplicidade, subserviência e dissimulação. Não serão consideradas ilegais, indecentes, imorais ou amorais ou impatrióticas as cartadas que mesmo sujas tragam benefícios a seus interesses e aos interesses do grupo que o sustenta, ou melhor, que o maneja como a um títere, um boneco obediente movido pelos astutos cordões.
Você deve saber disso e deve estar pensando:
- E daí? Sempre foi assim e vai ser.
É. Lamento. Isto não me impede porém de buscar neste “palheiro” - a “agulha”. Deve haver alguém. Alguém que não se acomode às ingerências escusas do processo. Alguém que nega vender seu caráter, sua dignidade. Alguém como eu, como você. Nós somos muitos.
Esses venais bandidos não são tantos. Unidos, muitas vezes, na cumplicidade do crime são nocivos, perigosos é verdade. Submetidos a tal estado de putrefação criam sua realidade virtual de grandeza e veneração. Vaidosos não admitem seus pés de barro. Resistamos, pois, às aparências, aos sibilantes sorrisos paternais ou maternais ou fraternos.
Há sim, em meio à corja, gente decente.
A política é uma arte? Não vamos permitir em nosso palco um drama sem fim.
Não será milagre dar visibilidade a quem merece. Não se esqueça:
Também há lírios no lodo.

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