terça-feira, 29 de janeiro de 2013

BUSCA



                              

                           BUSCA


Onde estão os meus mortos?
Em vão tento encontrá-los

De que lugares escuros terei que desenterrá-los?

Onde estão meus falecidos, aqueles com quem vivi?

Que é dos entes queridos que me deixaram aqui?

Por onde vou procurá-los?

Por que caminhos, que vãos?

Por que túneis e vielas?

Por que pontes, em que chãos?

Assim, perguntava eu aquele que encontrava

Que sempre penalizado algum lugar indicava

Até que um dia, acredite, uma voz me respondeu

Indagando confrangido a quem procurava eu?

Respondi-lhe entristecida

E ele com muita calma segredou-me a sorrir:

- Estão dentro de su’alma.

          Com meu carinho e profundo pesar 
                                  Zelia da Costa

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

ABSTRATO



                                          ABSTRATO
Abstrato! Sou apaixonada por certas palavras que hipnotizam por sua conotação mágica. Lembro-me que a primeira vez que a ouvi e li, foi na escola. A professora disse:
- Os substantivos podem ser abstratos ou concretos.
Para mim, concreto era algo fácil de entender. O substantivo concreto tinha que ter peso, forma, volume, cor, medida, visibilidade, mas e o abstrato?
Ela começou falando que o substantivo abstrato era algo que você sente e que existe, porém não se vê.
Eu era criança. Fiquei fascinada! Nem me lembro de ela se deter em mais explicações. Para mim bastava. A verdade é que era possível escrever palavras cujos significados reais escapam ao nosso domínio e que só existem, se existimos. Um quase mistério.
Ah! O tal substantivo abstrato era invisível!
Eu, até podia escrevê-lo, fazer o seu registro. Nunca, porém, usá-lo sem compromisso como fazia com o substantivo concreto!
Como exemplo, ela citou:
- Maria sente saudade.
Para a mestra, saudade era um substantivo abstrato. Existe, mas não se vê. Como a alegria, a dor, a felicidade...
Aí, eu fiquei confusa. A saudade de minha mãe ainda doía demais. Eu sabia até o tamanhão que tinha e entendi que o mistério do abstrato é que ele pode ser concreto para uns e invisível para outros.
Hoje sei que aí reside a trama das relações. O abstrato é para mim, o signo das ideias. Quando escrevo corro livre pelo texto e quando leio, me envolvo na arquitetura desenvolvida por tangentes expressões.
Vou lhe perguntar uma coisa:
- Alguma vez, já se surpreendeu com a reação de alguém que interpretou o que você disse, de modo absolutamente desconectado da sua original intenção?
Pode culpar o abstrato! Se isso aconteceu.
Não existe justa forma de identificar o que se sente e ser capaz de universalizar a emoção.
Quando assisto a esses programas produzidos para televisão, sobre incríveis pesquisas a que se dedicam os cientistas – físicos, astrônomos, engenheiros, etc. - na busca de respostas para intrigantes teorias e que eles usufruem do privilegiado “olhar futuro”: arguto, frio, documentado, investigativo, inteligente e exacerbado pela notável potência das sensíveis lentes dos telescópios que remetem imagens de extraordinária beleza em medidas universais com informações preciosas e que navegam a velocidades incomuns, a bordo de foguetes exploradores rompendo o espaço e mergulhando numa viagem sem volta, além, além...
Penso que somos seduzidos, não pelas respostas e sim pela pergunta:
- Onde? 
OAbstrato?
         E este independe de nós.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

ACREDITE SE QUISER



                                       

                                        ACREDITE SE QUISER
                       

                     Pela primeira vez, o País era convocado para ouvir o Presidente da República, recém eleito, na televisão!
                     Hoje, a gente até desliga o aparelho se não consegue mudar de canal, mas naquela época a TV era quase uma novidade, logo, era bastante inusitado este anunciado evento.  Nunca antes na história deste País isto ocorrera sob tal expectativa. Ele faria uma proclamação? Qual seria o teor de seu discurso? Faria algum desafio? Alguma queixa? Certamente, agradeceria os votos recebidos na eleição, falaria sobre a posse...
      - O Presidente Juscelino vai falar hoje na televisão!
      - Você vai assistir?
      - Vou!
      - Eu vou pra casa da minha avó. Minha família vai toda pra lá. Vamos vê-lo juntos.
            Nem todos tinham “o aparelho de TV”. Por isso os vizinhos, amigos e parentes se organizaram atraídos pela novidade.
                 Algumas pessoas que saíam do trabalho se agrupavam pelas calçadas, diante das vitrines de lojas de eletrodomésticos que exibiam uma TV funcionando, como irresistível atração e aguardavam, entre o burburinho das opiniões, o pronunciamento de Juscelino.
            Enfim, chegou a hora. Não lembro se o prefixo  musical foi a Protofonia do Guarani ou parte do Hino Nacional Brasileiro, mas foi algo que criou e alimentou densa atmosfera de nacionalidade e respeito. A ansiedade tornou-se quase palpável.
        Alto e magro. Ele não era bonito. Elegante, sim. Tinha um sorriso iluminado e com a radiante simpatia mineira saudou o povo. Começou por falar do seu Projeto de Governo – Cinquenta anos em Cinco - e para que todos, sem exceção, o entendessem com clareza foi, didaticamente, traduzindo o que significava o conjunto de Metas que organizaria o futuro do País e o conduziria à prosperidade. Explicou, usando quadros estatísticos, cuidadosamente elaborados, onde detalhava todo o processo -  os objetivos de cada uma das Metas e sua inserção no plano geral, os limites de tempo para sua execução, o custo do investimento, o grupo de trabalho envolvido no processo e o nome do responsável pelo gerenciamento. Tudo tinha consistência, tamanho, importância, preço, definição, datas de início e fim.
  Havia sempre um compromisso definido. Uma data para prestação de contas ao povo.
             Não falava como um Professor, mas como alguém que nos fazia crer, sermos importantes e a quem ele devia satisfação como se fossemos, é verdade, seus parceiros leais.
           Ele comprometeu a população com o seu destino!
  Imagina! Um povo acostumado a ser súdito, verdadeira “massa de manobra”, de repente, perceber que o governo está sendo compartilhado de forma transparente e inequívoca. Era uma experiência tão nova quanto surpreendente.
   O Presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira inaugurou, embora com grande atraso, nos idos de 1956 - o verdadeiro Sistema Democrático Republicano Brasileiro! Era espantoso. Quase uma traição à comodidade brasileira, ao nosso “espírito Macunaíma”, aquele herói sem nenhum caráter. Estranhamos. Não era pra menos. Ele não se exibia como o Pai do Povo, título comum e muito apreciado pelos líderes dos governos ditatoriais. Nem fazia o estilo soberano inerente aos mandatários que eleitos necessitam impor distância segura entre suas escusas ações e o povo que governa. Ele não ocultava suas intenções, não se inseria no jogo corrupto do poder. Com a oposição foi generoso e severo.
   O fato de investir na prosperidade fez com que os brasileiros acreditassem nas suas próprias possibilidades de inserção e vitória e fomos tomados por um soberbo amor ao País! Ele era “pé quente”!
    Foram os Anos Dourados!
   Adhemar Ferreira da Silva se fez Campeão Olímpico no Salto Triplo na Cidade de Melbourne, Austrália. Sua marca só foi batida quarenta e oito anos depois. Esse foi o seu primeiro título e deu início a uma série de vitórias.
    Gilmar, De Sordi, Bellini, Zito, Orlando, Nilton Santos, Garrincha, Didi, Vavá, Pelé, Zagalo, a gloriosa Seleção Brasileira de Futebol vence na Suécia e traz para o Brasil, em 1958, sob o comando de Feola, a Primeira Copa do Mundo.
    Maria Esther Bueno foi a primeira tenista brasileira a vencer e se tornar a grande campeã em Wimbledon. Começo de carreira longa e brilhante.
    Havia uma atmosfera de bem estar e orgulho.
    O Cinema Brasileiro ganha a Palma de Ouro no Festival de Cannes (França) com  “O Pagador de Promessas”. Enquanto o filme “O Cangaceiro” se torna sucesso pelo mundo.
    A Bossa Nova atravessa a fronteira e a Música Brasileira ganha novas dimensões.
    Avançar cinquenta anos em cinco!
    Depois desta primeira vez, ele aparecia nas telas dos jornais, exibidos nas salas de cinema e na televisão, inaugurando as obras propostas, nas datas estabelecidas. 
             Então, era verdade! Podia acontecer! 
             Não era propaganda enganosa.
   Juscelino criou a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), aumentou a produção de petróleo da Petrobrás, promoveu a Indústria Naval e a Indústria Siderúrgica. Construiu as grandes Usinas Hidrelétricas de Furnas e a de Três Marias. Promoveu a implantação da Indústria Automobilística. Abriu as rodovias que uniram regiões brasileiras.
   A inflação subiu, no entanto o País crescia 7,9% ao ano, crescimento nunca visto antes, nem depois na história deste País e o salário mínimo do trabalhador brasileiro em 1959, descontada a inflação, quer dizer, em valores reais, foi considerado o mais alto de todos os tempos.
   Ele investiu na Política Externa quando formulou a Operação Panamericana.
   Outras inúmeras oportunidades de comunicação se tornaram frequentes até que anunciou para espanto geral, a construção de Brasília! Há muito, a Constituição Brasileira preconizava a mudança da sede do Governo Federal para o Planalto. Era importante que acontecesse, mas quando?
   Agora, Juscelino falava com certa intimidade. Ganhara a confiança do povo. Os caminhões FNM (fenemês) rodavam pelas novas estradas e havia orgulho nos olhares brasileiros porque todas as metas obedeciam aos cronogramas de execução. Aí, ele convocou a população mais uma vez para um programa especial na TV e nele anunciou, minuciosamente, o Projeto da Construção de Brasília e da Estrada Belém/Brasília.
    No dia seguinte, começaram as piadas humorísticas porque o Presidente garantiu a data de lançamento da pedra fundamental e a data da inauguração das obras.
       Era engraçado mesmo, vê-lo nas telas usando elegantemente  terno e “chapéu coco”,  sentado sobre uma enorme pedra, em meio a um matagal, cercado por engenheiros e arquitetos e pranchetas e candangos, todo sorridente comunicando que ali se ergueria Brasília, a nova capital!
      Não é que duvidássemos, porém desta vez era de tal magnitude a empreitada... Construir uma cidade em quatro anos, num lugar inóspito, árido...  Rasgar uma floresta virgem ligando a Amazonia ao Cerrado! O Norte ao Centro-Oeste?
      Durante alguns anos o Presidente Juscelino virou motivo de chacota para seus adversários políticos que não o pouparam.  Ironizavam sua determinação e também sua lucidez foi posta em dúvida. Até que no dia marcado, chefes de governos ou representantes e convidados chegaram e juntos com os candangos, (operários das construções), funcionários e com a exatidão de quem honra compromisso assumido, de quem ousa tomar as rédeas e domar o destino, BRASÍLIA foi inaugurada. Os brasileiros assistiram deslumbrados e sob o impacto das imagens da TV à cerimônia de inauguração da nova Capital do Brasil.
     O Governo Federal mudou-se da BELACAP (Rio de Janeiro) para a NOVACAP (Brasília). Eram as manchetes.
     O Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira teve a lisura e grandeza para formar uma equipe de homens de grande competência e seu entusiasmo contaminou todos que participavam de seu Projeto de Governo. O gênio de seus arquitetos e engenheiros criou traços tão inovadores que atravessarão o tempo exibindo sua modernidade. De operários a doutores todos viveram a magia de compartilhar um raro momento histórico.
             Apesar do trabalho hercúleo exigir muito esforço e uma enorme soma de dinheiro e empreiteiras e um cem número de outras empresas contratadas, o Presidente concluiu seu mandato sem enriquecer a custa da corrupção.
              Não é permitido ao Presidente e a sua esposa e familiares receberem presentes, acima do valor de cem dólares, portanto ele deixou o Palácio da Alvorada sem notável bagagem.
            Sua esposa Dona Sarah Kubitschek criou a Organização das Pioneiras Sociais e fundou o Sistema de Hospitais Volantes nos estados e o Hospital Flutuante, navio fabricado na Alemanha que percorria os rios da Amazonia, atendendo aos povos ribeirinhos e indígenas. Era uma mulher ativa e dedicada. Viúva, viveu da pensão do marido e morreu no apartamento que alugava.
            O Presidente Juscelino provou que para evoluir é indispensável que haja um Projeto de Governo. Sem isso, se instala a anarquia: obras são iniciadas, desbaratadas e abandonadas por não obedecerem a nenhum cronograma de realização. É importante que as Metas estabelecidas  sejam concretizadas com sucesso no tempo previsto para que não encareçam. É indispensável que a equipe selecionada para o trabalho tenha competência e compromisso. Urge que se imponham, de fato e sob o rigor da ética e da lei, severas punições a quem incorrer na malversação do dinheiro público.  Há que se exigir comprovados: caráter e dignidade de todos os seus colaboradores.  O Chefe de Estado tem que ser incorruptível.
      Era uma vez um homem digno, inteligente. Ele governou o BRASIL de 1956 a 1961 e teve a coragem de concretizar seus sonhos e fazer um Povo crer no Poder de sua Nação.
   Por que falo sobre isso com você?
   Porque tudo acabou.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

TAMBÉM HÁ LÍRIOS NO LODO



                    

                 TAMBÉM HÁ LÍRIOS NO LODO

Ninguém é santo! Seria demasiada ingenuidade esperar que os ânimos exacerbados na disputa política cujo nível só atinge a excelência no teor das ofensas e profundidade nas medíocres propostas fossem capazes de exibir com nobreza suas lídimas intenções.
Seria pedir demais. Seria inocência sem precedentes, às raias da burrice.
Por que aceitamos estas condições que agridem o bom senso e o nosso discernimento? Será que, inconscientemente, apoiamos este comportamento promíscuo na política e, por ignorância ou comodidade, consideramos que este índice de despudorada desfaçatez é conveniente às nossas fundamentais necessidades? Ou será que o descrédito nos faz reagir de forma indulgente, distante, acomodada, alheia?
A propaganda política procura ocultar o baixo nível de qualidade dos candidatos. Expõe a manipulação que escorre pegajosa das imagens, frases, ambições. Não é preciso ter inteligência superior ou alta sensibilidade para se observar. É grosseira. Deixa claro que seu objetivo é atingir, maciçamente, um público de baixa atenção e pouca, pouquíssima exigência.
Frases e imagens são repetidas à exaustão para que se tornem “verdades” subliminares.
Interessante ver o processo de “confecção” de um candidato. Dependendo do nível de ambição, este projeto se sofistica despudoradamente e seu custo empenha a vitória.  Cirurgias plásticas diminuem queixos, acomodam narizes, ajustam orelhas, implantam cabelos, retiram rugas, refazem dentes e maxilares. O botox ganha relevância nunca antes vista na estória deste país. Cabelos são tingidos. Sapatos com saltos embutidos alteram a altura. Roupas são cuidadosamente selecionadas para que feitios e cores informem ao público com dignidade a informalidade do candidato. Aulas de postura, manejo das mãos, do andar, do sorriso são cuidadosamente planejadas. A arte dos grandes gestos é treinada. Percebi, certa vez, que um candidato quando queria demonstrar segurança debruçava-se com intimidade sobre o pedestal que sustinha o texto do discurso. A aquisição de vocabulário e as frases de impacto repetidas à insanidade e até a modulação da voz são condições que fazem deste discípulo dedicado, um vencedor.
Quero esclarecer que o sucesso das aulas de impostação de voz, não raras vezes, deixa a desejar e que a expressão corporal embora treinada à desmedida sugere pistas da medíocre criatura matriz. Perfeição seria milagre.
Lembro-me de um presidente que ao mentir em discurso revirava os olhos e os erguia para os céus como se pedisse perdão pelas blasfêmias. Era um movimento involuntário, resquício talvez de consciência.
Quanto maior a excelência no processo de construção do candidato mais fica evidente a importância de vida e de morte no jogo do poder.
Há um batalhão de especialistas, profissionais caríssimos,mestres na arquitetura e montagem deste ser quase alienígena!
Quem é esta criatura que se submete à tamanha metamorfose, cumprindo um ritual exaustivo, muitas vezes doloroso, alheio a sua verdadeira identidade? Por que, mesmo conscientes desta manipulação, acreditamos que ele ou ela será capaz de cometer a verdade.
De tempos em tempos, o jogo político é aberto. As cartas estão na mesa. É um jogo asqueroso. Quanto mais os jogadores forem capazes de trapacear, mais serão louvados pela malícia, perspicácia, inteligência, cumplicidade, subserviência e dissimulação. Não serão consideradas ilegais, indecentes, imorais ou amorais ou impatrióticas as cartadas que mesmo sujas tragam benefícios a seus interesses e aos interesses do grupo que o sustenta, ou melhor, que o maneja como a um títere, um boneco obediente movido pelos astutos cordões.
Você deve saber disso e deve estar pensando:
- E daí? Sempre foi assim e vai ser.
É. Lamento. Isto não me impede porém de buscar neste “palheiro” - a “agulha”. Deve haver alguém. Alguém que não se acomode às ingerências escusas do processo. Alguém que nega vender seu caráter, sua dignidade. Alguém como eu, como você. Nós somos muitos.
Esses venais bandidos não são tantos. Unidos, muitas vezes, na cumplicidade do crime são nocivos, perigosos é verdade. Submetidos a tal estado de putrefação criam sua realidade virtual de grandeza e veneração. Vaidosos não admitem seus pés de barro. Resistamos, pois, às aparências, aos sibilantes sorrisos paternais ou maternais ou fraternos.
Há sim, em meio à corja, gente decente.
A política é uma arte? Não vamos permitir em nosso palco um drama sem fim.
Não será milagre dar visibilidade a quem merece. Não se esqueça:
Também há lírios no lodo.