quinta-feira, 8 de novembro de 2012

QUANDO OS DEUSES CANSAM





         
                 
              Rogo para que Zeus retorne breve. A gloriosa Grécia e seu Povo 

merecem nova
               e urgente  oportunidade.
               

                       QUANDO OS DEUSES CANSAM

     - Já não me comovem as imagens horrendas
                       que vagam no turbulento território...
     - Cansei de querer resolver as contendas, as mazelas
                       e o infortúnio!

      Era como Zeus falava do alto de sua grandeza
      Fitando a Grécia conturbada pela cobiça cruenta
      Enquanto cabisbaixos, deuses de menor poder
      Ouviam, amargurados, a revolta do Sumo Ser:

      - Dei-lhes proteção e riquezas:
                                                  terras, mares, poder
      - Dei-lhes célebres vitórias
      - Dei-lhes saúde e prazer
      - Dei-lhes oportunidades de criar o belo, de enriquecer
      - Dei-lhes a sabedoria do pensar, do compreender
      - Faltou lhes dar, é verdade, a miséria em que vão viver

         Apoiado num cajado, cansado e sem ilusão
         Zeus abandonou o Olimpo, os gregos e o perdão.                                                                                                                   

É CONVERSANDO QUE SE ENTENDE



É CONVERSANDO QUE SE ENTENDE

- Você viu?
- O quê?
- Não viu? Era enorme! Deitada, bem no meio da estrada. Deve estar morta!
- Eu não vi. Estava vendo a floresta. Estava olhando para o lado. Quem era? Onde foi?
Antes que eu pedisse, ele retornou.
Lá estava ela; imóvel sobre a faixa amarela central. Embora a estrada tivesse trânsito contínuo de caminhões, talvez por ser domingo, talvez pelo horário de almoço ou talvez pelo santo forte da serpente que não sabíamos, ainda, se estava viva.
Meu marido estacionou o carro e descemos. Ela parecia morta. Ele pegou uma tira comprida, resto de pneu que havia no acostamento, se aproximou dela e o balançou. Assustada com a ousadia, com a interferência indevida no seu, até então, tranquilo banho de sol deu um bote. Levamos um susto. Era grande: gorda e comprida. Ele escapou por pouco. E agora?
Ela voltou à mesma posição mais atenta aos nossos movimentos.
- Olha! Vem um caminhão! Se ficar aí, vai morrer!
- Vai claro, mas ela não está disposta a sair.
Jogamos um pedaço de pau para assustá-la. Ela não se moveu. Percebi que estávamos desmoralizados.
- Carolina já viu que não somos de nada. Ela não tem medo da gente.
Ele olhou pra mim com um sorriso zombeteiro e a certeza - eu não ia permitir que nenhum mal atingisse a, agora, minha cobra Carolina.
Meu marido foi para o meio da estrada sinalizando para o caminhoneiro que surgia.Rogava para que diminuísse a velocidade.
Eu sabia que Carolina estava vendo nossa aflição. Imóvel ela nos observava.
O veículo passou lentamente. Era enorme. Uma carreta longa e  pesada. Ela não se assustou. Quando o motorista viu Carolina lançou sobre nós um olhar de desdém. Certamente, achou que perdeu a oportunidade de livrar o mundo de mais uma cobra. Seguiu aborrecido. A ele se seguiram mais três e uma moto com dois rapazes que estacionaram mais adiante e vieram ao nosso encontro.
- Ela foi atropelada?
- Ainda não, respondi apreensiva.
Não sabia qual o interesse deles em Carolina. Fui logo deixando claro:
- Eu não a quero ferida.
Um deles se embrenhou pelo matagal. Voltou com um galho coberto de folhas que despiu rápido liberando uma forquilha e tentou usá-lo para puxar Carolina. Ela, arrogante levantou a cabeça e se ergueu corajosa e ameaçadora escapando da armadilha. O outro rapaz com sotaque regional carregado e com um jeito de quem sabia o que estava dizendo, rindo falou:
- Eta! Que ela agora tá braba! Enrodilhou-se toda pra atacar! Ficou nervosa a bicha! Ê jiboião!
        Súbito, fez-se uma procissão de caminhões. Meu marido continuava sinalizando junto com um dos motociclistas e os caminhoneiros ao passar, ora aprovavam, ora achavam tolice tanta preocupação com uma jiboia.
        Aquela era uma estrada importante e parece que, agora sim, chegara hora preferida para o transporte da soja,  riqueza da região, rumo à exportação.
       Carolina sentiu estar no centro das atenções e comecei a ficar aflita com a situação:
- Se você continuar no meio da estrada vai morrer. Nós não vamos  poder ficar aqui toda vida. Vamos, sai daí! Sai logo! As pessoas vão matar você. A gente não quer que isso aconteça. Anda, sai logo enquanto não vem caminhão. Insisti comovida, mais de uma vez.
 Então, ela esticou o corpo no chão e ergueu só a cabeça. Sem nos  perder de vista começou a vir de ré na nossa direção. Atravessou, lentamente, a pista. Venceu o acostamento, sempre nos olhando. A ponta do rabo bateu no meio fio que limitava a estrada. Ele o contornou com suavidade enquanto o resto do corpo deslizava. Com elegância, sempre andando para trás, ela penetrou no matagal e ainda com a cabeça erguida desapareceu.
       Os dois rapazes se despediram sorridentes e agradecemos pela solidariedade. Felizes se foram.
       - Pronto, sua Carolina está salva!
       - Não está, não. Ela pensa que me engana. Ela está escondida aqui na beiradinha da mata esperando a gente sair pra ela voltar. É tinhosa a bichinha.
        - Ah! Essa não! Como você pode saber?
         - Encosta a caminhonete bem junto ao meio fio, vai devagar e ronca o motor com força, bem ali onde ela entrou. Você vai ver!
         Ele foi em silêncio até o ponto indicado. Quando o motor roncou... Carolina disparou floresta adentro. O mato balançava na sua fuga aflita!
         Rimos muito. Ela deve estar correndo até hoje.
        O que mais me intriga é por que ela não seguiu em frente? Por que não atravessou a estrada, se estava posicionada naquela direção.  Era o mais lógico. Seguir em frente. Por que ela veio de ré e, desafiadoramente, passou entre nós? Tudo levava a crer que ela seguiria para o outro lado da floresta.Seria a rota natural.  Se ela nos temia por que passou entre nós?
            Não, não nos temeu. Entendeu e confiou. Só isso.
- Agora me diz. Por que Carolina?
        - Talvez, porque toda Carolina que eu conheço é inteligente e audaciosa.
         Ele riu balançando a cabeça.
         Por onde andará minha Carolina?
         Por onde for... Deus a proteja!

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

É JUSTO?

 

                                   É JUSTO?
Como fazer justa, a Justiça?
Se sobre ela cala a piedade
Se sob seu martelo decidido existe a vítima e a maldade

Como fazer justa, a Justiça?
Quando ignora a origen do ato
                      que pode condenar por inocente
                      que pode absolver o condenado

Como fazer justa a Justiça?
Se o jugo pela densidade se atém ao tempo exíguo
                       do momento predestinado

Como fazer justa a Justiça?
Quando um crime é perpetuado na memória não cicatrizada
                       marca de cruel passado
Como fazer justa a Justiça que se alheia prenha de vaidade
e distancia a verdade plena, da intenção sinistra de um fato

Como fazer justa a Justiça?
Se ela exibe como troféu raro a balança que sem esforço sustenta
                       e, cegamente, julga todo ato.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

AGORA E NA HORA... AMÉM



               



                   AGORA E NA HORA... AMÉM
                                    
                               China x Japão
                                Síria x Turquia
                                Irã x Israel
        Nem eu, nem você, nem ninguém verá surgir o sol do alento
        Já, a Esperança se desavém
        A luz que banha a esquálida Paz
        e ilumina as benesses de um novo tempo...  
        Tende a se apagar
        Não restará nem testemunhas, nem signos 
        para calcar nossa passagem neste lugar
        Dos restos de nossos restos... poeira
        Dos feitos, só os rejeitos
        Que pena!
        A sombra dissemina o mal que nos impusemos
        Além de toda ruína decomporá a cena
        A catástrofe se aproxima...
        Atentem todos:
-     - A guerra que extermina vai começar de novo!

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

ORA! DIREIS...



                                              ORA! DIREIS...

Estava escurecendo. Ele me tomou pela mão e me levou ao jardim.
- Olha o que está acontecendo no céu! As estrelas estão acendendo!
Eu, criança, ali guiada pelo meu Pai, segui-o naquela viagem pelo espaço a observar atenta os pontos luminosos  rutilantes.
- Escolhe duas estrelas pra você.
- Posso?
- Pode, mas olha bem porque elas serão suas pelo resto da vida.
- Eu quero aquela grande piscando...
- E a outra?
- Aquela pequenininha perto dela.
- Tem certeza?
- Tenho.
- Então, presta atenção, olha bem pra elas. Marca bem o lugar. Elas estarão sempre lá. São suas. Suas amigas. Você vai poder conversar com elas e elas vão sempre ouvir.
- Posso escolher outras?
- Não. Porque você depois pode confundir com muitas. Duas. Aquelas duas. Você vai sempre saber onde encontrar.
            Ali. Daquele jeito meigo, protetor e generoso meu pai me ensinou o aconchego da solidão. Mostrou-me suas estrelas e as estrelas de minha mãe que já estava muito doente.
- Elas nunca vão sair dali? Perguntei preocupada.
- Podem até se mover um pouquinho, mas estarão sempre ali. Guarda bem o desenho do lugar. É importante não esquecer a posição. Afinal, são suas amigas!
 E sorriu satisfeito.
Cresci fazendo amigos pela Natureza. Tenho árvores, caminhos, praias, montanhas, pedras, estradas e até silêncios... Descobri que os silêncios se diferem. Alguns desses amigos se perderam no tempo, graças à ação inexorável do progresso ou à insanidade humana, porém temerosa registrei suas imagens e momentos de nossa preciosa convivência e os visito e os revejo quando quero, acionando minha memória afetiva.
                   PALMARES
Eu tenho uma estrada que me acompanha
Que, às vezes, segue na frente
E às vezes, estranhamente, atravessa minhas entranhas
É longa... é sinuosa, anda pelos meus caminhos
Quando estou chorosa, murmura canto de pássaros
E, se estou silente, contorna-me docemente com seus abraços
É uma estrada viva, altiva e vaidosa
Em cada cantinho seu há uma cor, um perfume, uma flor dengosa
Porque muito pisei neste chão que encontrei na solidão da vida
Ela se instalou com a intimidade de quem se credita amiga
Confidências trocamos, imagens lembramos de tempos idos
E minha estrada contente chora comoventes lágrimas antigas
Assim, combinamos, se o cansaço vier durante a caminhada...
Eu a tomo no colo
ou ela me carrega até o fim da jornada!
       Não sei mais em que estado se encontra a Estrada dos Palmares, em Santa Cruz/RJ, mas o meu morro permanece incólume, como convém a um grande guerreiro:
                    EU, MORRO...
Eu tenho um morro querido
que por mim foi escolhido, entre tantos
É um monte escondido pela mata
num tecido feito de plantas
Envolvido pelo encanto, ele acena sereno minhas cores favoritas
Ao som dos cantos dos pássaros
Inda ao afagar gostoso de uma brisa bendita
Meu morro vive tão longe...
Mas de mim não esconde sua imagem eterna
Que vive nesta saudade, em meio as minhas ramagens
- raízes da minha terra!
Sou grata a meu Pai por me fazer olhar para o céu. Por me ligar ao Espaço, por favorecer a intimidade com o Universo em verdadeira integração de forma doce, lúdica, natural. De quando em vez recitava, carinhosamente, um de seus poetas preferidos - Olavo Bilac.
                         OUVIR ESTRELAS
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las muitas vezes desperto
E abro as janelas, pálido de espanto...
E conversamos toda noite, enquanto
A via-Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir o sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!”
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?
E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e entender estrelas”.

Ao olhar a noite, em meio a tantas, sou capaz de vê-las, nitidamente. Estão lá. Moveram-se um pouco como Papai falou, contudo guardaram a mesma posição: a grande e a pequenininha piscando pra mim a sua mensagem de eterna cumplicidade. Elas me fazem erguer a cabeça e me integrar ao Universo.
Do seu jeito suave, meu Pai fez com que sua única filha nunca se sentisse só!
zeliadacostamt@gmail.com