quarta-feira, 6 de junho de 2012

BEM A TEMPO


                                          BEM A TEMPO

Estranho a sensação que me abstrai do cotidiano, que me aliena do momento presente e me devolve à cena e às vozes de um tempo vivido num espaço sonoro de múltiplas percepções. Rio, sozinha, ao perceber que me embriago nesta viagem, sem necessitar qualquer droga, pelo simples fato que bebo e cheiro e injeto em meus sentidos as emoções, numa orgia que exacerba minha sensibilidade faminta e que devora vorazmente, embora aparente calma, cada cena vivida no desencadear de minha história.
Acabo de ouvir num antigo gravador, uma fita com vozes crianças que não cantam mais. Alguns poucos cresceram, vivem. De um conjunto de dez, só cinco restaram. É isso o que me impressiona nesta viagem sonora e não tão distante, mas comovente.
Ao revisitar esse momento, identifico os múltiplos objetivos que entrelaçados de forma subliminar, lúdica e alegre estabeleciam conceitos importantes para o desenvolvimento inteligente de um grupo de alunos de três e quatro anos.
Diante do gravador, estou frente ao futuro. Ouvindo o som longínquo, sou arremessada ao tempo por vir, pois, era para ser colhido adiante, o fruto do trabalho estruturado naquele momento.
Percebe-se na gravação além das vozes que imitavam o leão, o cachorro, o gato, o tigre, ruídos relacionados à dinâmica de alguns gestos improvisados, mímica espontânea usada no registro das características do comportamento dos animais domésticos e na natureza.
O que me importa, já, é entender o tempo, esse enígma que domina nossas ambições e se revela senhor de nossos projetos e cúmplice perverso de nossas ansiedade e frustração.
Agora, aqui, ouvindo as vozes infantis quase toco no futuro. Este pretérito futuro que levou pra sempre Marcelinho, Guga, Ricardo, Larissa, Alison enfim, o indicativo de um futuro imperfeito.
O tempo é invento. Não tem medida. Assim, o passado não é imutável, vencido, alheio, antigo. Ele se move.Conspira. Congestiona. Caminha por onde o presente transita. Imprime sua presença nos sentidos, gestos e ações.
   Condiciona o que há de vir? Quem sabe?
Nem o futuro, para mim,se projeta obediente a um modelo ímpar. O futuro aciona as lembranças, precisa de memória que o impulsione e ancore. Não se localiza no espaço. É prova da imponderabilidade do tempo. A certeza da nossa pusilanimidade.
 Tudo foi, mas será? Nunca é.
O presente é a ilusão da certeza. Impressão volátil!
O tempo não existe. Existe a mente.
As vozes lindas que ouço não se foram. Nem irão.
E aquele futuro, num tempo passado... É presente agora.
Zelia da Costa/MT
            

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