domingo, 27 de maio de 2012


                        ATÉ QUANDO?
Não sou socióloga. Não entendo nada de psicologia. Dito isto, sinto-me bem mais à vontade para esta conversa.
Quando eu era criança, os adultos costumavam pedir para eu me afastar, se queriam conversar sobre coisas que eram impróprias aos ouvidos infantis. Embora algumas pessoas julgassem tolo o pedido, dado a minha pouca idade, minha mãe invariavelmente insistia porque sabia que eu era capaz, sim, de entender quase tudo que seria dito. Ela não tinha dúvidas. De nada valia a minha angelical expressão e o meu, planejado olhar inocente.
- Querida! Vá brincar lá fora um pouquinho com as meninas!
Eu ia. Danada da vida. Bem devagar... para dar tempo de saber do que tratariam. Distante, observava as expressões: sorrisos, olhares, cochichos, gestos, etc. Tentava decifrá-los.
Por que eu estou dizendo isto?
Porque vivi o suficiente para usar esta observação, exercitada durante anos, em benefício da minha perspicácia. Provavelmente, o fato de ter minha mãe morrido quando eu ainda era criança exacerbou meu instinto de defesa e apurou minha sensibilidade neste sentido.
- “Ler as entrelinhas” é mais que interpretar o texto. É atingir o âmago da intenção do autor( dizia meu amado Professor Manoel de Cavalcante Proença).
Estendi esta habilidade adquirida às conversas, aos discursos. Fui muito além dos textos escritos.
Será que isto tem alguma implicação com o motivo da minha angústia atual?
Às vezes, não é necessário ser tão arguta para perceber quando há um descompasso entre gestos, ações e a natureza dos propósitos que percorrem caminhos  tortuosos e íngremes tentando desnortear a observação para impedir a descoberta dos espúrios objetivos?
Compliquei?
Esclareço!
Você acha que há pessoas capazes de obstruir sua própria inteligência e sensibilidade para evitar ter que tomar decisões que lhe irão contradizer a impressão, fragilizar a convicção já explicitada, defendida até com certo furor, ou melhor, a opinião concebida e já desmoralizada sobre uma idéia, uma escolha ou sobre alguém.
Pior é quando esta impressão se caracteriza falsa e se deteriora pela força das evidências. Insistir em mantê-la latente torna-se questão de honra porque mudar de opinião, corrigir este engano será para certos indivíduos, assumir a cumplicidade no engodo evidenciando um erro de avaliação. Isto fere a própria vaidade. Arruína sua autoconfiança. Destrói sua credibilidade. Esta sua nociva crença sedimenta sua decisão. Covardemente, então insiste no erro. Cala. Omite-se.
E quando estas pessoas se multiplicam, multiplicam, multiplicam e atingem o número desalentador de milhões - um povo?
Penso: o que lhes faltou?
1 -  Ser expulso da conversa de adultos?
2 – Ter a mãe morta na sua infância?
3 - Ter sido aluno do notável Prof. Manoel de Cavalcante Proença?
4 – Ter a marca da Dignidade de meu Pai?
Ou saber que a Coragem é a Razão Maior da Própria Existência?
               Creio que fui clara. Entretanto, aconselho a todos cuja dignidade ainda clama começarem a “ler as entrelinhas”.

               Coragem.

Um comentário:

  1. Duras palavras, mas como sempre, sábias e verdadeiras.
    Confesso que fiquei preocupada, será que cometo esses erros?
    Bom texto para reflexão.
    Te amo.

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