UMA VIAGEM EXCITANTE
Mas não é maravilhoso?
Raramente, fico tão entusiasmada
como agora.
Acabo de chegar de viagem. Logo, eu vi. Ninguém me contou. Foi
emocionante. A criatividade brasileira, na minha opinião, atingiu o ápice em
matéria da tecnologia aplicada à arte...Será arte? Talvez seja, pois é tamanha
a inovação usada na cobertura de estradas... É sensacional! A cada momento o
inusitado acontece!
São pistas novas, mão dupla,
recém- construídas e isso é o formidável. Sabe o que inventamos?
- O asfalto solúvel!
Não conhece? Explico,claro, de
uma forma simplista porque tecnicamente,
não tenho competência para tanto. Vamos lá!
Trata-se de uma espécie de calda.
Isso. Uma calda rala de asfalto, carinhosamente derramada, pulverizada,
sobre uma colcha de pedras britadas. Entendeu? Agora o melhor: ela se
dissolve com água.
Você sabia que isso existe?
Não?!
Pode sentir orgulho grande porque
acabamos de inventar as “estradas movediças”! Uma surpresa!
- Uma hora tem... outra...não
tem.
Não é incrível? Deixa qualquer
Montanha Russa desmoralizada! Dirigir nestas estradas é pura adrenalina porque
o trânsito incessante obriga o motorista a manter os nervos tensos e o cérebro
numa excitação mórbida para enfrentar o inesperado. Para torná-las mais
excitantes não há acostamento nem sinalização. O mato que margeia as pistas
teima em querer atravessá-las. Não devia estar ali. Quando em vez, alguém
irresponsável atira um cigarro, ainda
aceso, pela janela e incendeia o capim
ou a turma da manutenção ateia fogo para poupar esforço e, aí, a fumaça cria
uma densa cortina impedindo a visão e o perigo se instala.A desorientação
perturba todos os sentidos de quem dirige.
O movimento nessas estradas é
dominado por enormes carretas de trinta metros de comprimento, lindas, muitas
equipadas com tecnologia avançada,
espetaculares, carregadas com toneladas de soja, algodão, milho,
madeira, etc. A produção agrícola do centro-oeste brasileiro transportando uma
parte importante da economia do país e que segue rumo a portos distantes, bem
distantes. Inconcebível não haver transporte ferroviário... mas isto é outra
história.
Como eu ia
dizendo, estes veículos ziguezagueiam numa coreografia infernal por estas estradas movediças para evitar os
buracos que se sucedem. Quando em vez, eles e vans e automóveis, todos os que
percorrem essas vias são inevitavelmente
surpreendidos e tombam pelo caminho porque seus eixos se quebram ou
pneus estouram ou no desvio para driblar as
abissais crateras formadas, eles avançam no sentido da mão oposta e se chocam, se incendeiam, se
destroçam, não por direção perigosa, extrema
velocidade ou condições péssimas
de seus veículos e sim, pelo inesperado - os criminosos obstáculos
imprevisíveis. Não, por imperícia e sim pela inacreditável invenção brasileira
– a rala camada, a tal calda dissolve!
Essas estradas
não foram planejadas e pavimentadas para o fim a que também se destinam:
transporte de cargas pesadas.
Aqui, não são os
motoristas - os bêbados. São as estradas que são bêbadas, drogadas porque elas
se perdem no traçado e na construção. De repente, se desfazem. E são tão
jovens! Lamento.
Quando as
autoridades são interpeladas sabem o que dizem?
- É a chuva! A
chuva acaba com as estradas!
Viu? Elas são solúveis na água! Acredita?
Não sei, não! Como é que as
estradas de outros países construídas há dezenas de anos aguentam tempestades,
sol, neve e continuam como tapetes? Maravilhosas!
Sabe o que eu
penso? Acompanhe meu mísero raciocínio:
1 1 -
Se a estrada tiver sua construção sólida vai
demorar anos a se realizar licitação fabulosa para sua manutenção. Humm?
2 - A calda
de asfalto prova a competência das nefastas intenções da organização. Funciona.
3 - Não é de domínio público a responsabilidade da
fiscalização e controle dessas obras. Não quero só responsabilizar órgãos.
Quero nomes de quem levou vantagem pecuniária com o engodo. Quero sua “cabeça a
prêmio”. Quero acompanhar sua fortuna. Quero perseguir seu caráter.
4 - Qual o
custo real de manutenção?
5 - Como a
engenharia brasileira de estradas e pontes não se constrange com a
desmoralização da sua competência? Como suporta?
6 - Qual o
montante destinado às estradas movediças?
7 - Ah!
Quanto pagamos para erguer os viadutos gigantescos construídos aleatoriamente,
monumentos “abobalhados”, coitados, perdidos em meio do nada. Um caminho de não
sei onde, levando a lugar nenhum? Envelhecidos, já deteriorados.
Monumentos abortados, decadentes. São
muitos. Imagina o prejuízo! Alguém ficou rico. Muito rico! Alguém não!Alguéns! Só rindo pra não chorar!
8 - Quais são
as grandes empresas, de verdade, que camufladas sob outro apelido atuam nesta
área?
Cinicamente.
9 - Como eu
podia esquecer das pontes? Ah! As pontes... Imagina! Que pontes?
1 10 - Qual a responsabilidade dos vereadores, prefeitos,
governadores, ministros e presidentes nesta trama sinistra? Afinal, eles são os funcionários que nos devem a qualidade
do produto de seu trabalho e nós os pagamos regiamente por isso. Somos seus
patrões.
Nota de Esclarecimento:
Para ser
justa devo esclarecer que as estradas movediças não são privilégio da Região
Centro-Oeste. Elas estendem a doçura
de sua rala calda asfáltica e a distribuição equânime de suas crateras também pela região norte e as
demais.
Agora,
sabe por que isso acontece?
Sabe por
que morrem filhos, pais, mães, crianças, velhos? Sabe por que são mutiladas,
cegas inutilizadas tantas pessoas?
Porque a
gente merece.
Nenhum comentário:
Postar um comentário